Um glorioso dia de Sol

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Resolvi naquele dia ir estrada fora. Sem destino e sem hora. 

O dia estava com um tom radioso e a vontade de sair pelo mundo era demais. A estrada convidava à contemplação e a música que ouvia fazia com que os pensamentos fossem todos em direcção a mil e um lugares de fantasia. 

A estrada comprida - como todas as estradas deveriam ser em dias gloriosos - não trazia ou levava ninguém. O vento quente que me afagava o rosto fazia-me sentir de bem com tudo e com todos. Naquela altura senti que estava feliz. E com tão pouco... mas estava feliz. 

Música, Sol, Tempo e uma ultra dose de Tranquilidade. Assim levava aquela manhã. Assim corria o meu dia. 

De repente, no horizonte, um carro parado na berma da estrada. Conforme me aproximava, vi que era uma mulher que andava de volta da viatura e, ao lado da estrada, um pneu furado. 

Não parei. As coisas que se ouvem fazem de nós animais desconfiados. Mas nem um quilómetro depois, e não tendo visto nada de suspeito, dei a volta e tornei a passar por ela. Estava tudo tão claro, que não vi porque não ajudar aquela mulher. Dei a volta de novo para estacionar na traseira do carro dela e saí. Pedi desculpa por não ter parado logo de início, mas que decerto compreenderia, atendendo aos dias de hoje. A voz com que me disse que entendia perfeitamente foi tão sensual e quente, que fiquei logo ali com vontade de lhe mudar os quatro pneus.

Enquanto procurei as ferramentas para a substituição do pneu, fomos conversando e fiquei a saber que, tal como eu, também ela tinha decidido dar uma volta de carro naquela manhã gloriosa de Sol. 

Não lhe perguntei nada que não fosse meramente circunstancial e perfeitamente natural. Profissional liberal e destacada naquela zona do país para resolver qualquer coisa numa das empresas do grupo a que pertencia. Tinha um rosto que, não sendo um rosto de capa de revista, era um rosto perfeito. Embora não lhe tenha perguntado, há muito que tinha passado a idade de Balzac, mas tinha um ar e um porte de quem sabia cuidar-se.

Quando tirou o casaco - para supostamente me ajudar - deu para perceber que tinha um corpo escultural. Se sei ser cavalheiro, é um facto que também sei ser observador. 

A mudança do pneumático tinha chegado ao fim. Estávamos de novo prontos para retomar a estrada, mas alguma coisa teríamos dito um ao outro para que houvesse logo ali um tipo de empatia que muitas vezes ganhamos mas não sabemos explicar porquê. 

Porque não irmos a um café-esplanada e conversarmos tranquilamente sobre nós? Não temos nada que fazer e sempre é uma maneira curiosa de conhecer alguém. Eu não ia ter com ninguém e, ao que soube, ela andava sozinha. Estava sozinha. 

Dei comigo e com ela junto ao mar numa esplanada ainda sem ninguém e onde começámos a conversar sobre tudo e sobre nós. Tinha uns olhos que indiciavam segurança e tranquilidade. Os gestos já não eram nervosos e sim próprios duma mulher que estava segura do que fazia e dizia. 

Gosto do toque. Sempre privilegiei o toque. Faz-nos sentir perto dos outros. Quando assim o queremos. Segurei-lhe na mão convidando-a a irmos passear pela falésia. Tremi. Como tremi! Ainda agora tremo!... 

O dia estava mesmo esplendoroso. Andámos a pé até só vermos mesmo o mar e os montes que bordejavam a praia. Aquela zona do país é deveras linda. Não se via vivalma. Normalmente por ali não anda ninguém. A não ser as gaivotas... e os casais apaixonados. 

As dunas, o mar e a praia estavam em movimento perfeito. O Sol estava agora naquela altura da manhã que convida mesmo a sentar no chão e deixar que ele nos aqueça. Só se ouvia o mar... e a nossa conversa que já não lembro sobre o que era!

Sei que lhe fiz uma festa no rosto. Julgo que lhe fiz a festa a tremer. Ela decerto que sentiu. Durante uma eternidade de 5 segundos ficámos a olhar nos olhos um do outro e... sei que a beijei, mas que beijei com tal paixão, que um pouco mais de paixão poderia até ser sinónimo de loucura. A loucura própria dos apaixonados. 

Os nossos corpos encaixaram-se num abraço que só quem abraça de verdade pode saber o que é. Sentia todo o corpo dela envolto no meu. Não podíamos de forma alguma estar mais perto um do outro. Não sei explicar como, mas estávamos nus e rodeados de tanta paixão que, se o mundo acabasse ali, não teríamos dado conta. 

Beijei cada poro daquele corpo como se fosse o último corpo, ou o último beijo que pudesse dar. A pele na pele avilta todos os sentidos. E fizemos amor como mais ninguém terá feito amor. As nossas línguas trocavam frémitos de prazer inaudito e a minha paixão traduzia-se também em golpes enérgicos da minha virilidade que estava dentro dela. Senti-a gemer de prazer. Senti que gemia apaixonadamente e com um prazer indescritível. Quando os meus lábios lhe roçaram os mamilos entumescidos, senti-lhe o corpo como se quisesse levantar e flutuar. Levei a minha língua mais abaixo sempre sem perder o contacto daquela pele quente e sedosa, até que lhe parei no centro de todas as coisas. Tremeu. Como tremeu! Eu era o responsável por aquela inaudita tremura... 

O orgasmo dela teve contornos duma explosão sideral. Não sei descrever tão intenso prazer. Sei que os lábios dela percorreram todos os milímetros do meu corpo e os meus, os dela. Poderíamos ficar a fazer amor até ao fim dos tempos. Nada importava. Só aquele prazer louco e arrebatado sem descrição possível. 

Quando senti que me beijava e fazia desaparecer o meu sexo dentro daquela boca cheia de desejo e paixão arrebatada, julgo que tive uma sensação até de dor. O prazer, em doses ilimitadas, dói. Mas era uma dor que ainda agora queria ter como companhia eterna. Explodi em mil fragrâncias de desejo. Senti como que um mundo estivesse a nascer. Senti-me perto do Big Bang. O começo de tudo.

Fechei os olhos enquanto rodopiava com a língua na língua dela e me apertava contra ela, até um sublime torpor nos envolver. Não tinhamos palavras para aquilo que estávamos a sentir. A paixão tinha-nos arrebatado por completo. Nus, tal como crianças traquinas, naquela praia deserta, éramos donos de tudo o que nos rodeava. Abraçados e embalados pelas ondas, enquanto mergulhámos no mar, sentíamos a paixão tomar de novo conta de nós. 

O mar sereno dava-nos pequenos empurrões, mas que não eram suficientes para fazer com que os nossos sexos se separassem. Uma e outra vez fui empurrando o sexo dela com o meu até estarmos de novo caídos na areia húmida. O Sol quente, ora nas minhas costas ora nas costas dela, fez com que aquele abraço mais uma vez se tornasse num abraço de gozo total. E novamente atingi um turbilhão de emoções dentro dela. 

Jamais seria de pensar ter vivido momento igual. Num sussurro quase imperceptível, lembro de lhe ter dito, com os lábios quase colados à nuca, que a desejava como nunca tinha desejado nada nem ninguém. Os braços e o peito dela, completamente enleados no meu corpo, estavam em perfeita sintonia com o abraço que me dava com as coxas firmes que tinha. E tremia. Sei que tremia de profundo e inaudito prazer. Os orgasmos contínuos não deixavam enganar. A expressão dela valia mais que qualquer palavra. A força e a emoção com que beijava eram por si a maior recompensa que um amante podia ter. Senti que nada ou quase nada teria força para nos separar. Com a língua dela no meu ouvido consegui ouvir, apesar de ter os sentidos em anormal turbilhão, um desejo que a trazia suspensa desde sempre. Queria ser penetrada onde a maioria das mulheres sente medo ou repulsa. Fiquei louco, alucinado mesmo, de prazer. Olhar aquelas ancas firmes e colocar as mãos como quem agarra o céu naquela visão celestial foi o suficiente para que com carinho e muito amor penetrasse aquele ânus que mais não era que a entrada do céu... disfarçado. O prazer que dei e que senti, jamais teria capacidade de o transcrever nesta simples narrativa. Os olhos e a boca dela foram e serão a maior recompensa que poderia ter por ter feito alguém tão feliz. Juntos tínhamos atingido as estrelas. Nada seria como até então tinha sido. Os nossos sentidos tomariam outra dimensão. A partir dali faríamos parte dum grupo de gente muito restrita que amou e foi amado até ao supremo clímax.

Quando nos despedimos na estrada, onde tínhamos deixado os carros, sentimos que nunca mais nos veríamos. Nem o nome tínhamos perguntado. Chegámos ali de mãos dadas e com a certeza que por alguns momentos tínhamos sido literalmente felizes. 

Vi o carro dela desaparecer para Norte. 

Eu continuei aquela manhã gloriosa para Sul.

 

Jorge Costa

Pés Quentinhos

 

Textos originais do Jorge Costa. Se querem reproduzi-los, 

peçam-lhe autorização a ele. Mas depois não se admirem 

se ele vos quiser levantar com o macaco...

Ilustrações de São Rosas.

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